Pode ser sinal de que a Casa de Saud viu a luz – à parte estar sendo gravemente prejudicada pela própria estratégia de forçar os preços do petróleo para baixo. Implicaria, no longo prazo, uma Casa de Saud alinhada mais intimamente com a parceria estratégica Rússia-China – dado que a China é o principal parceiro comercial dos sauditas e, de longe, o maior consumidor de petróleo.
A motivação chave da Casa de Saud para forçar os preços do petróleo para baixo em 2014 foi dobrar a Rússia na questão síria. Agora já se tem o veredito econômico – que se resume a desastre absoluto, com a Arábia Saudita exibindo déficit de 16% do PIB e a avaliação do seu crédito soberano em 2015 rebaixado para “A+/A-1”, dos “AA-/A-1+” em que estava, pela agência Standard and Poor’s.
A Rússia, por sua vez, não parou de bombear petróleo. E, como se não bastasse, Moscou mandou sua Força Aérea, com toda a pompa, para proteger Damasco.
Significa que a Casa de Saud fracassou essencialmente no projeto de arrancar a fatia de mercado que continua a pertencer à Rússia, e que Moscou e Pequim aprofundaram sua parceria estratégica; crucial, por exemplo, é o fato de que a [empresa] Gazprom Neft – a terceira maior produtora de petróleo da Rússia –, desde janeiro vende a Pequim em moeda chinesa.
À frente está a Rota da Seda
Os preços do petróleo continuarão baixos em 2016. A OPEP continuará fraturada. Mas a Rússia conseguiu sobreviver, assim como o Irã. Quanto à Casa de Saud, o prêmio de ‘consolação’ é que a sua estratégia de preço baixo conseguiu tirar do mercado mais de um competidor.
Especialistas e insiders norte-americanos do petróleo garantem que o que realmente faz sentido é Rússia e Arábia Saudita aliadas, não inimigas. Para a OPEP e o clube do petrodólar do Golfo, reduzir em apenas 10% sua produção de petróleo, junto com a Rússia, bastaria para fazer dobrar o preço do petróleo – o qual, aliás, foi derrubado pelos próprios sauditas. Significaria cerca de $180 bilhões de lucros anuais para a Rússia e outros tantos para a Arábia Saudita.
Isso torna o acordo de petróleo entre russos e sauditas mais importante a cada dia. Atores poderosos, intimamente ligados a Riad estão tentando fazer acontecer – o que pode levar a uma avenida pavimentada literalmente com ouro.
A reaproximação entre sauditas e árabes da OPEP e a Rússia, e potencialmente com o Irã, abrirá o caminho para que o clube do petrodólar do Golfo integre-se ao maior projeto de infraestrutura global que a história moderna jamais viu: o projeto “Um Cinturão, uma Rota”, ou a integração de toda a Eurásia pelo comércio e por infraestrutura de primeira qualidade. As Novas Rotas da Seda chinesas serão progressivamente integradas com a Rússia e com os estados da União Econômica Eurasiana, UEE (ing. Eurasian Economic Union, EEU).
A escolha que se abre diante da Casa de Saud é clara: apostar na integração da Eurásia – e lucrar com ela; ou continuar a armar e ampliar gangues e gangues de doidos wahhabistas. Essa é ação que, do jeito clássico como o chicote volta sobre o lombo do chicoteador, acabará por voltar-se contra a própria matriz ideológica – com os fundamentalistas decidindo-se a tomar Meca.
Mas… que ninguém espere, de uma Casa de Saud paranoica, enlouquecida de medo, que tome decisão racional.
Pepe Escobar (1954) é jornalista, brasileiro, vive em São Paulo, Hong Kong e Paris, mas publica exclusivamente em inglês. Mantém coluna no Asia Times Online; é também analista de política de blogs e sites como: Sputinik, Tom Dispatch, Information Clearing House, Red Voltaire e outros; é correspondente/ articulista das redes Russia Today e Al-Jazeera.